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A importância das emoções na consolidação das memórias

31 de outubro de 2022
E-docente

Somos aquilo que lembramos, mas também o que esquecemos, disse o grande pesquisador da área de memória Ivan Izquierdo (2004). De fato, somos nossas memórias.

Imagina se todos os dias levantássemos e tivéssemos esquecido tudo que já vivemos? Se todos os dias tivéssemos que reaprender a falar, andar e se trocar? Ou seja, somos quem somos, pois lembramos quem somos nós a todo momento.

Parece confuso, mas na verdade é simples: a base de nossa personalidade são nossas memórias. E como funciona nossa memória?

Quer saber mais sobre a importância das emoções na consolidação das memórias? Então, confira o conteúdo que preparamos para você!

Qual a importância das emoções na consolidação das memórias?

Do ponto de vista neurofisiológico, a memória é um mecanismo muito complexo, pois seu funcionamento se dá em rede; sendo assim, não há um local fixo em nosso cérebro onde ficam armazenadas as memórias, como se fossem gavetas.

A memória fica espalhada pelo nosso córtex (camada mais superior do cérebro), mas quem gerencia a memória não é o córtex, mas as regiões mais profundas do sistema nervoso, sendo uma delas o hipocampo.

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O hipocampo é uma estrutura fininha que tem um formato de cavalo marinho (por isso, o termo hippocampus – “cavalo marinho”, em inglês). Há dois hipocampos em nossa cabeça: um em cada hemisfério dentro de nosso sistema límbico (sistema gerenciador das emoções): é aí onde memória e emoção se conectam.

Tudo que vivemos tem sempre uma emoção empregada. É impossível fazermos qualquer coisa em nossa vida de forma “a-emocional” (sem emoções).

Quando falamos em emoções, pelas neurociências, estamos falando em processos fisiológicos que geram sensações corporais e estados mentais. Por exemplo: sentimos medo, nossa barriga dói, suamos frio e o coração acelera.

Essas sensações corporais são a emoção “medo”. Quando sentimos angústia, sentimos um aperto no peito, a respiração ofegante e uma inquietação do corpo; esses sintomas físicos são o que podemos chamar de emoção.

Portanto, todos os momentos de nossa vida mobilizam esses processos fisiológicos viscerais, corporais e mentais; por isso, não é possível separar as experiências das emoções. A ideia do senso comum de separar a razão de emoção, na realidade, é uma falácia. 

A relação entre emoção e memória

Essa façanha não é possível, uma vez que o cérebro que pensa (razão) é o mesmo que processa as emoções, como também só há cognição porque memórias são processadas, mas só há memórias, pois há emoções, uma vez que são elas que “determinam” o que deve ser memorizado e descartado.

Agora, como a emoção contribui na consolidação da memória? Antes de responder a essa pergunta, vamos entender um pouco melhor o que é memória.

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Do ponto de vista das neurociências, memória é o “bit” de informação, ou seja, o impulso elétrico que registra uma determinada situação ou elemento.

Isso difere da lembrança que é quando juntamos várias memórias e recriamos em nossa mente um acontecimento, uma situação, um conteúdo ou o quer que seja.

Por exemplo: se lembramos de nosso cachorrinho quando estamos falando dele para alguém que não o conhece, a imagem dele que vem em nossa cabeça é uma lembrança formada de várias memórias:

Quando eu penso no meu cachorro, todas essas memórias individuais, que dizem respeito aos elementos que compõem somente o meu cachorro, são acionadas e integradas pelo hipocampo (e outras áreas) e, com isso, temos a imagem mental do cachorro como um todo.

Portanto, na verdade, nosso cérebro recria da forma mais aproximada possível nossas lembranças a partir de alguns elementos de nossas memórias.

Por este motivo, a memória não é muito digna de confiança, pois, como não é fidedigna, mas sim uma recriação, é passível de erros, que são chamadas de falsas memórias.

Tipos de memória

Existem vários tipos de memória (sensorial, motora, consciência, inconsciente, emocional, priming, de curta e longa duração, de trabalho e outras mais).

Cada uma delas tem uma função em como operacionalizamos a cognição. Mas todas elas têm algo em comum: a emoção. Por quê?

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O cérebro é um órgão que tem como principal objetivo sobreviver e passar adiante sua carga genética. Ele é extremamente potente, mas não é ilimitado.

Sendo assim, ele dá prioridade para armazenar as informações que são importantes para sua sobrevivência. E quem chancela a importância das coisas? A emoção.

Se o cérebro julga uma coisa desinteressante para armazená-la? Se ele não vê funcionalidade para algo aprendido, melhor descartá-lo para “sobrar espaço” para coisas mais relevantes.

Ou seja, quanto mais uma situação que vivemos está envolta a fortes emoções, mais impregnada em nosso cérebro fica a informação.

Todo mundo lembra do primeiro beijo, do dia da morte de uma pessoa amada ou de um assalto sofrido, pois esses são acontecimentos emocionalmente marcantes. Mas, dificilmente, lembramos do que almoçamos há 15 dias, devido a ser algo corriqueiro, sem muita valência emocional.

A não ser que a comida estivesse estragada e isso levasse a pessoa a uma internação por contaminação; nesse caso, esse almoço será eternamente lembrado, justamente, por causa da “forte emoção” do acontecimento.

Então, emoções intensas, sejam elas consideradas por nós boas ou ruins, vão sempre potencializar a carga elétrica na hora de consolidar a memória. 

O impacto das emoções na consolidação das memórias

Memorizar as coisas que mais amamos e nos fazem bem faz com que o cérebro fique com gostinho de “quero mais” e isso promova motivação para continuarmos vivendo.

Da mesma forma, memorizar os piores momentos da vida, o que nos causa dor e medo, pode parecer cruel, mas é importantíssimo para a sobrevivência, pois a partir dessas lembranças que julgamos negativas poderemos nos proteger e fugir do perigo e de situações que possam pôr nossa vida em risco.

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Portanto, sendo a emoção a melhor ou a pior do mundo na nossa opinião, é ela que vai “ditar” para nosso cérebro o que deve ser memorizado e o que deve ser descartado. 

Situações corriqueiras, com baixo teor emocional, desinteressantes ou sem aplicabilidade na vida, são rapidamente descartadas de nossa mente. 

O funcionamento do hipocampo

Do ponto de vista neuroanatômico, como dito anteriormente, o hipocampo é o responsável por gerenciar as memórias, isto é, por “decidir” para onde as informações devem ir para serem armazenadas e o que deve ou não ser memorizado, além de participação na recuperação e integração das memórias no momento da lembrança.

Encostado na parte da frente do hipocampo, há uma bolinha que chamamos de amígdala que nada mais é do que o “sensor” de perigo de nosso sistema.

A amígdala é responsável pelas emoções mais intensas e primitivas que temos, tais como medo, impulsos violentos e sexuais, e ela participa também em outras emoções quando essas são muito intensas.

Logo, se a amígdala está próxima ao hipocampo (que gerencia a memória), nada mais lógico que ela tenha uma forte influência na validação emocional da informação que está passando pelo hipocampo na hora da consolidação da memória.

Na realidade, nosso sistema límbico é conhecido por ser o centro das emoções, mas ele é o sistema responsável pelo gerenciamento das emoções e da memória. Emoção e memória são como pão e manteiga ou queijo com goiabada: uma combinação inseparável.

Portanto, quando pensamos em processo de ensino precisamos considerar esses achados científicos. 

Conclusão

Uma aula com bom vínculo afetivo entre professor e turma, com didática interessante e lúdica, tende a contribuir sensivelmente no aprendizado dos estudantes, já que gostar da aula e do professor, se sentir à vontade no grupo e aprender se divertindo só contribui para a memorização dos conteúdos por serem emoções importantes para nosso sistema.

Pensem sempre nisso quando entrarmos em uma sala de aula.  

Gostou de saber mais sobre emoções na consolidação das memórias? Então, confira nosso conteúdo sobre a importância das neurociências e da inclusão escolar!

Prof. Dra. Viviane Louro é pianista, educadora musical e neurocientista. Docente do departamento de música da Universidade Federal de Pernambuco, onde, além de lecionar, coordena os seguintes projetos: PROBEM DO CAC (programa para saúde mental dos estudantes de música); Liga Acadêmica de Neurociências Aplicada (LIANA); Especialização em Neurociências, Música e Inclusão; e Comissão de humanização e saúde mental da UFPE. Autora de 8 livros na área de educação musical inclusiva e palestrante sobre as áreas de neurociências da música, psicomotricidade e música e educação musical inclusiva. Atualmente, está se especializando em Criminal Profile e psicologia investigativa.

Bibliografia consultada e sugestões para estudo

ADÃO, Anabel do Nascimento. A ligação entre memória, emoção e aprendizagem. In: CONGRESSO NACIONAL DE EDUCAÇÃO, 6., 2013, Curitiba. Anais […]. Curitiba: Universidade Católica do Paraná, 2013. 

IZQUIERDO, Ivan. A arte de esquecer. Rio de Janeiro: Vieira & Lent, 2004.] IZQUIERDO, IZQUIERDO, Ivan. Memória. Rio de Janeiro: Artmed, 2002.

JOCA, Sâmia et al. Estresse, depressão e hipocampo. Revista Brasileira de Psiquiatria, 2003; v. 25, Supl. II, p. 46- 51.

KANDEL, Eric. R. Em busca da memória: o nascimento de uma nova ciência da mente. Trad: Rejane Rubino. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. 

MARGIS, Regina, et al. Relação entre estressor

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