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F​​atores de risco para comportamento transgressor dos alunos

29 de setembro de 2022
E-docente

Sempre que aparecem nos noticiários crimes bárbaros, como pais matando filhos ou vice-versa, massacres em escolas ou assassinatos em séries com crueldade ou “bizarrices”, todos ficam horrorizados, mas, ao mesmo tempo, curiosos e intrigados com esse comportamento transgressor.

É interessante como atribuímos o comportamento transgressor ou criminoso sempre à desumanidade ou monstruosidade, mas acontece que, na verdade, nada mais humano do que o comportamento socialmente transgressor.

Quer saber mais sobre os fatores de risco para comportamento transgressor dos alunos? Então, confira o conteúdo que preparamos para você!

Saiba mais sobre o comportamento transgressor dos alunos!

Saiba mais sobre o comportamento transgressor dos alunos!

O Homo Sapiens Sapiens (vulgo, nós) é a espécie mais violenta do planeta, sendo os únicos que matam a si mesmos por fatores que não sejam proteção, alimentação e seleção sexual.

Até na Bíblia isso fica demonstrado: Adão e Eva mal saem do paraíso e já acontece um crime passional na família (Caim mata Abel por ciúmes e inveja).

Aqui algumas perguntas surgem: nasce-se mal ou torna-se mal? Há um “gene” da maldade ou do comportamento transgressor? Há indícios desde a tenra idade que a pessoa poderá se tornar uma pessoa nociva socialmente? O que a ciência diz sobre o comportamento transgressor e criminoso?

Precisamos sempre lembrar que o ser humano é composto por dados genéticos que nascem com ele, mas isso não determina totalmente seu comportamento no mundo, pois vivemos em sociedade e os valores aprendidos, as experiências vividas e a subjetividade da interpretação de mundo, que é individual, tem seu papel nessa equação.

Por isso, é difícil de dizer com certeza se um comportamento transgressor é fruto do biológico ou do social. O mais razoável é dizer sempre que há influência de ambos os lados.

O que diz a Ciência para o comportamento transgressor

Pesquisas na área de psiquiatria forense e neurocriminologia têm conseguido mapear alterações neurológicas importantes em pessoas que cometeram crimes violentos.

As pesquisas mostram que áreas do córtex pré-frontal são disfuncionais em pessoas com perfis antissociais, os ditos psicopatas/sociopatas.

As áreas orbitofrontal e ventromedial do córtex frontal são profundamente envolvidas com as questões de:

  • moralidade, 
  • empatia, 
  • culpa, 
  • remorso, 
  • filtro social,
  • E ajuste do comportamento social.

Sendo que, quando estão alteradas por motivos de patologia, tumores, lesões ou disfuncionalidade, são responsáveis por alterações de conduta e comportamento social.

Em suma, se essas áreas não funcionam, a moralidade da pessoa fica comprometida. Além disso, há alterações no sistema límbico, mais especificamente na amígdala, que é o “sensor” de medo.

Pessoas com comportamentos transgressores e antissociais têm menos medo de punição e, muitas vezes, incapacidade cognitiva de compreender a gravidade de seus atos e de mudar o comportamento, mesmo após anos de punição.

De uma forma muito resumida, podemos dizer que o comportamento humano é fruto do comando do cérebro do indivíduo e, como já comentado, o cérebro é moldado parte por questões genéticas, parte pelas experiências do meio. 

Componentes genéticos e contextuais como influência

As pesquisas mostram que existem componentes genéticos para o comportamento violento e até mesmo criminoso, mas também fatores como o desenvolvimento do feto na gestação (ingestão de álcool, tabaco ou outras drogas, radiação ou alguns medicamentos ingeridos durante a gravidez) ou como batidas fortes na cabeça quando criança (principalmente no lobo frontal), ou ainda fatores relacionados a infâncias roubadas pela negligência, pela violência física e pelo abuso sexual são aspectos de alto risco para comportamentos socialmente disfuncionais na adolescência e na fase adulta.

Às vezes, por um uma grande e infeliz casualidade (ou não), indivíduos vêm com o pacote completo: propensão genética + gravidez de risco + acidente na infância e/ou infância desestruturada.

Esses casos são os mais graves e, se estudarmos a vida de muitos dos mais cruéis e bestiais assassinos da história, a maioria tem esse “kit tragédia” em seu histórico.

O comportamento desafiador e transgressor tende a já aparecer na infância. De acordo com Elia (2021):

O transtorno de conduta envolve um padrão repetitivo de comportamento que viola os direitos básicos de terceiros. Em geral tem início no final da infância ou no começo da adolescência e é mais comum em meninos do que em meninas. A hereditariedade e o ambiente provavelmente influenciam o desenvolvimento de um transtorno de conduta. A criança geralmente tem pais com um distúrbio da saúde mental, como abuso de substânciastranstorno do déficit de atenção com hiperatividadetranstorno do humoresquizofrenia ou transtorno de personalidade antissocial. No entanto, as crianças afetadas podem vir de famílias saudáveis que funcionam bem.

Os primeiros indícios de Comportamento Transgressor

A escola é, muitas vezes, o primeiro ambiente a perceber os comportamentos transgressores dessas crianças e, nesses casos, precisa intervir urgentemente.

Dentre os comportamentos típicos de tais crianças, estão:

Comportamentos típicos crianças


Nem todos apresentam todos os sintomas acima, mas, aparecendo de forma frequente comportamentos como esses, a escola já deve ligar o alerta.

Importante ressaltar que o diagnóstico de transtorno de conduta precisa ser dado por um médico especialista, uma vez que tais comportamentos também podem estar ligados a fases momentâneas da vida de uma criança por motivos diversos: divórcio dos pais, morte de alguém querido da família, mudança de cidade, dentre outros fatores.

Crianças que sofrem abuso em casa podem apresentar comportamentos violentos e transgressores também.

Por este motivo, a escola precisa estar sempre atenta diante desses tipos de comportamento, porque estes podem ser advindos de algum período estressante da vida do estudante, podem ser resposta a abusos domésticos ou escolares ou podem ser comportamentos típicos de um transtorno. 

Para cada caso, um direcionamento diferente

Para cada caso listado na seção anterior, o direcionamento deve ser diferente.

Se a questão é um momento passageiro, a escola precisa acolher a criança e tentar criar estratégias pedagógicas para lidar com essa fase.

Se o problema for algum tipo de abuso sofrido pela criança, isso precisa ser imediatamente cessado e denunciado; e a criança, começar a ser tratada psicologicamente.

Agora, se o caso for um transtorno de conduta ou outro tipo de transtorno mental, a criança precisa de um trabalho interdisciplinar, tratamento médico, psiquiátrico, psicológico e constante diálogo entre família e escola para que todos atuem juntos para tentarem lidar com a situação.

No caso dos adolescentes, a atenção precisa ser redobrada, já que eles têm mais autonomia para decidirem o que fazer, mais força física e uma cognição mais capaz de elaboração. Os massacres que acontecem em escolas, por exemplo, geralmente, são feitos por adolescentes.

O comportamento disfuncional e transgressor na adolescência pode também ter vários motivos:  um transtorno de conduta, uma depressão severa, no qual há uma forte distorção cognitiva, que faz o indivíduo querer “se vingar” ou “se afirmar” diante de um grupo; influência de outros jovens; surtos psicóticos por doença mental de base genética ou por abuso de substância química; problemas de relacionamentos interpessoais ou familiares, dentre outros.

A adolescência é um momento complexo da vida, em que há muitas mudanças hormonais, neurológicas e sociais. No início da adolescência, há uma poda neural muito importante nos circuitos de recompensa do cérebro.

Isso significa que os adolescentes perdem uma quantidade significativa de sinapses em regiões ligadas ao prazer. Junto disso, tem os hormônios da sexualidade, mudanças corporais e todas as pressões sociais para a entrada no mundo adulto. 

Conclusão comportamento trangressor

Conclusão

Por tudo isso, adolescentes tendem a sentir mais tédio, serem mais isolados e terem mais mudanças comportamentais e alguns, diante de tudo isso, sucumbem.

Se o adolescente tiver uma propensão para doenças mentais ou não tiver uma boa base emocional ou ainda tiver uma história de vida muito sofrida e tiver dificuldade com sua resiliência, essas mudanças todas podem desencadear comportamentos muito disfuncionais e nocivos para ele (automutilação, suicídio) ou para a sociedade (comportamento transgressor/criminoso).

Por todos esses motivos, a escola precisa estar sempre atenta. Os professores precisam ser preparados para perceber pequenos sinais que podem ligar o “botão de alerta”.

A escola pode intervir antes que o comportamento piore ou alguma tragédia aconteça. Existe crianças más? A resposta é SIM. Existem jovens cruéis? A resposta é SIM. Mas existe também a possibilidade de intervenção e, na maioria dos casos, de tratamento para mudança desses comportamentos.

Certamente, há casos em que são muitos os fatores que levam a certos comportamentos transgressores e nem sempre é possível mudar, mas, para a grande maioria dos casos, há o que fazer: acolhimento, compreensão (ao invés de punição), paciência e tratamento adequado por parte da família, escola e área de saúde podem, SIM, fazer muita diferença.


Gostou de saber mais sobre os fatores de risco para comportamento transgressor dos alunos? Então, confira o nosso artigo sobre saúde mental pós-pandemia, neurociências e aprendizado!

Prof. Dra. Viviane Louro é pianista, educadora musical e neurocientista. Docente do departamento de música da Universidade Federal de Pernambuco, onde, além de lecionar, coordena os seguintes projetos: PROBEM DO CAC (programa para saúde mental dos estudantes de música); Liga Acadêmica de Neurociências Aplicada (LIANA); Especialização em Neurociências, Música e Inclusão; e Comissão de humanização e saúde mental da UFPE. Autora de 8 livros na área de educação musical inclusiva e palestrante sobre as áreas de neurociências da música, psicomotricidade e música e educação musical inclusiva. Atualmente, está se especializando em Criminal Profile e psicologia investigativa.

Bibliografia consultada e sugestões para estudo

ARREGUY, Marília Etienne. A leitura das emoções e comportamento violento mapeado no cérebro. Physis: Revista de Saúde Coletiva, v. 20, p. 1267-1292, 2010.

AUGUSTO, Cristiane Brandão. A medicina brasileira e o cérebro (do) criminoso na virada do século XIX-XX. In: Cérebro criminógeno: estudo sobre a etiologia do crime a partir da medicalização da sociedade. 2010. p. 124-201.

BORDIN, Isabel AS; OFFORD, David R. Transtorno da conduta e comportamento anti-social. Brazilian Journal of Psychiatry, v. 22, p. 12-15, 2000.

JOSEPHINE, Elia. Transtorno de conduta. Manual MSD versão saúde para a família. Escrito em 2021. Disponível em: <msdmanuals.com/pt-br/casa/problemas-de-saúde-infantil/distúrbios-da-saúde-mental-em-crianças-e-adolescentes/transtorno-de-conduta>. Acesso em: 27 mai. de 2022.

PASCHOAL, Douglas. O cérebro de um criminoso. Escrito em 2020. Disponível em < https://www.douglaspaschoal.com.br/blog/cerebro_crime>. Acesso em: 27 Mai. de 2022.

PESCE, Renata. Violência familiar e comportamento agressivo e transgressor na infância: uma revisão da literatura. Ciência & Saúde Coletiva, v. 14, n. 2, p. 507-518, 2009.

RIANE, Adrian. Anatomia da violência. Rio de Janeiro: ArtMed, 2015.TAVARES, Priscilla Albuquerque; PIETROBOM, Francine Carvalho. Fatores associados à violência escolar: evidências para o Estado de São Paulo. Estudos Econômicos (São Paulo), v. 46, n

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