Educação Financeira nas escolas: Por que falar?
Nada como começar o ano com as contas pagas e sem dívidas, não é mesmo? Há quem diga que essa tranquilidade não tem preço! E essa afirmação tem fundamento, pois estudos do Serasa (2022) indicam que o acúmulo de dívidas e a falta de dinheiro estão entre as principais causas de adoecimento mental da população.
No entanto, para além do impacto emocional, a conquista de bens materiais, como comida, roupa, celular, carro e viagens, deve se associar ao planejamento, que é resultado do desenvolvimento da educação financeira ao longo da vida.
Parece um cálculo simples: gastar menos do que se ganha. Contudo, com o estímulo constante ao consumo e com o fácil acesso ao crédito (carnês, cartão de crédito, financiamentos, créditos consignados e cheques especiais), essa equação, frequentemente, não fecha, e uma bola de neve pode começar a se formar.
Para evitar que isso ocorra, o letramento financeiro tornou-se urgente em sociedades globalizadas. Isso se deve ao fato de que ele assegura que as pessoas, independentemente de seu rendimento ou status social, tenham acesso a serviços financeiros relevantes e saibam como utilizá-los de maneira eficaz.
O que é a Educação Financeira?
De maneira objetiva, a Educação Financeira é um processo que busca ampliar a compreensão sobre a gestão de finanças pessoais.
Ela é um tema interdisciplinar que visa desenvolver habilidades, permitindo que as pessoas tomem decisões mais conscientes e assertivas, estabelecendo uma relação saudável com o dinheiro.
Por meio da Educação Financeira, as pessoas conseguem analisar como e por que utilizar de forma responsável o dinheiro, ajudando não apenas a economizar, mas a realizar seus sonhos e a conquistar uma vida mais confortável, permitindo que elas façam escolhas responsáveis, controlem os gastos e tenham uma previsão orçamentária para planejar o futuro com mais tranquilidade.
A urgência de se trabalhar a educação financeira
Segundo dados da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), aproximadamente 77,9% da população brasileira iniciou 2023 endividada.
Deste número, a maior parte das pessoas está na faixa etária de 26 a 40 anos, e o valor médio das dívidas é de R$ 4.493,90, sendo a maior parte delas associada à inflação e aos altos juros.
Adicionalmente, dados da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic) de 2021, indicam que o principal vilão do endividamento no Brasil é o cartão de crédito, responsável por 85,2% dos casos.
E engana-se quem pensa que as pessoas com altos salários não têm dívidas. Segundo a mesma pesquisa (Peic, 2021), o número de pessoas com mais de 10 salários-mínimos endividadas também cresceu em 2021, alcançando 66% da população.
Apesar de serem muitos os motivos que causam esse resultado, isso mostra que não adianta ter um bom poder aquisitivo, se não souber como gerenciá-lo corretamente. A falta de educação financeira agrava as consequências.
Pessoas que desenvolvem uma relação saudável com o dinheiro desde criança conseguem gerenciá-lo melhor; ao controlar os gastos e poupar (previsibilidade financeira), conseguem planejar com mais tranquilidade o seu futuro.
Obrigatoriedade de trabalhar o tema nas escolas
No intuito de combater essa lacuna, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), desde 2020, torna a educação financeira obrigatória para toda a educação básica (da Educação Infantil até o Ensino Médio), exigindo que o tema se desenvolva de forma multidisciplinar no currículo de escolas públicas e privadas em todo o país.
O objetivo de sua inclusão nas escolas é justamente combater o endividamento da população e fazer com que as futuras gerações aprendam a administrar o dinheiro de forma responsável, e consequentemente, sejam atores multiplicadores em seus lares, contribuindo com informações para a melhoria do orçamento familiar.
No entanto, cabe ressaltar que a missão de trabalhar a educação financeira não se restringe somente às aulas de matemática. Segundo a BNCC, o tema deve estar dentro de todos os componentes curriculares, pois o trabalho com o tema envolve as dimensões culturais, sociais, econômicas, políticas, psicológicas, entre outras.
Como abordar a educação financeira nas aulas?
Para promover a educação financeira nas escolas, basta pensar no mundo em que vivemos. Do mercado às guerras, são muitos os exemplos que podemos usar. Em um primeiro momento, é comum pensar que esse é um tema que passa somente pela matemática. No entanto, ele é um tema bastante flexível, podendo ser abordado em diferentes áreas.
A origem do dinheiro e o seu desenvolvimento ao longo dos anos são temas tão versáteis que podem ser trabalhados de maneira leve e lúdica em todos os segmentos da educação básica, ou seja, da Educação Infantil até o Ensino Médio.
Por exemplo, na Educação Infantil, é possível explorar contações de histórias, brincadeiras, parlendas, conversas e jogos que abordam o sistema numérico e permitem trabalhar com a noção de valor (menor e maior – grandezas e medidas).
Há uma variedade de recursos que podem ser usados nas aulas, tais como a confecção de dinheiro fictício, uma árvore de dinheiro, criação de cofrinhos, realização de uma feirinha, uso de desenhos animados, entre outros.
Sugestões de recursos
Vídeos
A vila Sésamo possui um compilado de desenhos que abordam a educação financeira disponível no seu canal do YouTube.
A Turma da Mônica também possui uma lista de desenhos sobre o tema no YouTube
Leitura
Atividades sobre Educação Financeira nas escolas para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental
Nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, é possível trabalhar o reconhecimento de cédulas e moedas por meio de atividades práticas e lúdicas.
Por exemplo, pode-se propor a divisão da turma em grupos nos quais cada um deverá escolher um grupo social característico do Brasil (indígena, quilombolas, ribeirinhos, seringueiros, vaqueiros, caiçaras, pantaneiros etc.).
Baseados em pesquisas, cada grupo deve criar um mapa com indicações sobre as paisagens (urbana e rural), os recursos naturais, as matérias-primas, as atividades econômicas, a diversidade animal, a alimentação e a herança cultural.
Em seguida, eles podem confeccionar artefatos característicos de cada grupo social para intercambiar em uma feira, determinando o valor de cada artefato com o uso do escambo (troca) ou de dinheiro fictício.
A utilização de dinheiro fictício ou a criação de um sistema financeiro próprio pode ser uma brincadeira que contribua para o desenvolvimento de conceitos relacionados ao consumo consciente, poupar, crédito, entre outros.
Nas interações e transações realizadas no mercado, as crianças poderão exercitar a soma e a subtração por meio de transações financeiras.
Atividades sobre Educação Financeira nas escolas para os Anos Finais do Ensino Fundamental
Nos Anos Finais do Ensino Fundamental, é possível explorar a conversão de moedas de diferentes países e propor uma atividade interdisciplinar envolvendo Arte, Ciências, Geografia, História, Matemática e Língua Portuguesa.
Por exemplo, pode-se solicitar que a turma se organize em pequenos grupos, e que cada um escolha um país para confeccionar um planisfério.
Nesse mapa, devem constar indicações demográficas (extensão territorial, população, capital etc.), principais atividades econômicas, principais produtos importados e exportados, e, claro, a moeda oficial.
Em seguida, cada grupo deverá indicar um país com o qual deseja realizar uma transação econômica, considerando a diferença cambial. A ideia é que cada país aumente suas reservas, sendo a moeda dessa poupança determinada por cada grupo.
Atividades sobre Educação Financeira nas escolas do Ensino Médio
Já no Ensino Médio, por exemplo, é possível trabalhar com empreendedorismo, dividindo a turma em grupos nos quais cada um deverá criar uma empresa.
Eles deverão decidir a cidade em que a empresa será localizada (considerando diferenças de impostos, logística, poder de compra local, distância da matéria-prima ou fornecedor, variação cambial), selecionar a instituição financeira para realizar um empréstimo para aquisição de crédito para o investimento, calcular os juros e o balanço financeiro (considerando despesas e receitas) e considerar o pagamento dos impostos.
Adicionalmente, é possível trabalhar nas escolas, nos diferentes segmentos da educação básica, o impacto social do dinheiro, as mudanças de moedas oficiais, o uso de moedas alternativas, os efeitos da inflação com estudo de casos de países, a influência da taxa de juros nos investimentos externos dos países, a relação entre consumo e controle de gastos, o poder de compra em diferentes países, a má distribuição de renda e a desigualdade social, o consumo consciente e os princípios da sustentabilidade, entre outros.
Conclusão
Como se pode notar, é possível utilizar diversas abordagens relacionadas ao cotidiano dos estudantes e fazer com que a assimilação de conceitos importantes da educação financeira ocorra de maneira leve e engajadora.
A sua inclusão como parte das pautas nas salas de aula, seja por meio de recursos didáticos, projetos ou outro tipo de intervenção pedagógica, não é apenas um ato de preparação para o futuro, mas um compromisso com a construção de futuras gerações mais conscientes, autônomas e preparadas para lidar com os desafios do século XXI.
Por fim, a construção de uma sociedade mais equitativa passa necessariamente pelo desenvolvimento integral do sujeito (cognitivo, emocional e atitudinal), e a educação financeira nas escolas se torna um investimento no futuro de todos nós.