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Educação e antirracismo: Vamos refletir sobre uma educação antirracista!

16 de novembro de 2023
E-docente

“Numa sociedade racista, não basta não ser racista. É necessário ser antirracista.” Esse discurso da filósofa e militante estadunidense, Angela Davis, além de confrontar a sociedade com o racismo que a constitui, convoca a todos para uma mudança de atitude, para um enfrentamento do racismo.

Ser antirracista é urgente no Brasil, país de capitalismo dependente, que possui essa ferramenta (o racismo) como política, jurídica e economicamente estruturante. Um campo fundamental para essa luta é o da educação. Mas qual educação?

Inicialmente, precisamos explicar que nos referimos a uma formação democrática, ou seja, a uma universalização educacional, a uma educação que se realiza nas experiências cotidianas, nas vivências reais. Isto é, discutimos uma formação não necessariamente institucionalizada.

Pensamos uma educação sobretudo para a crítica, que nos possibilite nos colocar no mundo para melhorá-lo (hooks, 2019). Nisto reside a luta por uma educação antirracista. 

Uma prática essencial em busca dessa educação exige não apenas uma mudança de perspectiva, como também uma ampliação do ponto de vista para as muitas histórias e povos que nos constituem.

Assim, faz-se necessário contestar, por exemplo, os estereótipos construídos historicamente de que os negros escravizados foram dóceis, portanto, não resistiram ao trabalho forçado, e de que os indígenas, por serem preguiçosos, não se adaptaram ao trabalho pesado no Brasil colonial.

É na contramão desses mitos, perpetuados a partir do que os brancos contaram, que refletimos aqui sobre uma formação democrática, antirracista e, fundamentalmente, anticapitalista.

Por uma educação democrática

 Segundo a Constituição de 1988, a Constituição Democrática, a educação é dever da família e do Estado e direito de todos. Trata-se portanto de um direito fundamental para a cidadania da pessoa e também para sua qualificação para o trabalho. Todavia, nem o acesso nem a qualidade da educação é uma realidade para todos os brasileiros.

Um relatório sobre equidade na educação, publicado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), em parceria com a Todos pela Educação e Itaú Social, aponta que, em 2019, quase 25% de negros e pardos de 18 a 24 anos não estudavam nem trabalhavam.

Entre os brancos, o índice era de 17%. Situação agravada pela pandemia nos anos de 2020 e 2021, conforme mostra notícia publicada no G1.

Podemos recuperar que já em 1824 a Constituição do Império resguardava a educação a todos os cidadãos. Nesse período, o negro escravizado não tinha a cidadania reconhecida.

Ademais, o acesso dos negros libertos a esse direito dependia de suas posses e rendimentos. Logo, não era tão certo assim que eles teriam a garantia do acesso.

A Constituição de 1988 também prevê o acesso e a permanência na escola como princípio de igualdade das condições.

Entretanto, além do acesso igualitário não ser uma realidade, o modo como o conhecimento se articula, sobretudo nas instituições formais de ensino, que muitas vezes atuam para a manutenção do status quo, contribuem para a perpetuação de desigualdades.

É o que revela o levantamento “As faces do racismo”, realizado pelo Instituto Locomotiva para a Central Única das Favelas, em junho de 2020, mostrando que mais de 90% dos brasileiros reconhecem que a cor da pele interfere nas chances de estudo e trabalho. Vejamos:

Soluções

É frente a quadros como este que bell hooks (2017) defende a necessidade de descolonizar a escola. Em “Ensinando a transgredir”, a autora se inspira em Paulo Freire e argumenta a favor de uma educação engajada que busque não apenas o conhecimento presente nos livros, mas que promova o conhecimento sobre ser e estar no mundo. 

Desse modo, muitos podem ser os espaços para que se partilhe conhecimento. Todos legítimos. Todos necessários.

Hooks (2019) defende uma aprendizagem que enriqueça integralmente a vida, que não comece e, muito menos, que não termine na sala de aula. Para tanto, a estudiosa enfatiza a necessidade de acompanharmos o nosso tempo.

Ela recorre a uma declaração de do educador e ativista Parker Palmer para apresentar a vitalidade dessa compreensão:

a educação em seu melhor – essa profunda transação humana chamada ensino e aprendizagem – não é só sobre conseguir informações ou conseguir um emprego. Educação é sobre cura e integridade. É sobre empoderamento, libertação, transcendência, sobre renovar a vitalidade da vida. É sobre encontrar e reivindicar a nós mesmos e a nosso lugar no mundo. (grifo meu, Palmer apud hooks, 2019, p. 201)

O reconhecimento das muitas desigualdades a que estão mais sujeitos os não brancos no Brasil é um primeiro passo para uma educação democrática e também antirracista. Inserir o debate no cotidiano e para além da sala de aula é essencial.

Educação e antirracismo: Por práticas educacionais antirracistas

A desnaturalização do racismo deve ser constante, permanente. É indispensável que os brancos enfrentem suas fragilidades. Isto implica se colocar aberta e honestamente para com o conforto ou privilégios propiciados pela cor da pele.

É preciso que os brancos sejam confrontados com a racialidade, como explica Robin DiAngelo em entrevista para a CNN Brasil.

Do ponto de vista jurídico, a Lei 10.639/2003 foi um marco por alterar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.394/96), tornando obrigatório o ensino da história e da cultura africana e afro-brasileira na educação.

A partir desse momento, conquistado pela luta de alguns movimentos, sobretudo o Negro, foi se tornando mais efetivo o olhar para questões raciais. Ademais, mudanças começaram a ser realizadas tanto no tratamento dado aos conteúdos presentes nos materiais didáticos, quanto na formação exigida para os futuros docentes.

No contexto social mais amplo, podemos lembrar ações que têm sido provocadas, sobretudo a partir do movimento #BlackLivesMatter, iniciado em 2020 após o assassinato de George Floyd, pelo mundo, como por exemplo um maior debate sobre a questão racial no Brasil.

Nesse sentido, um trabalho interessante foi apresentado numa série de programas do Canal GNT, como no vídeo “Diálogos entre gerações”.

Conhecimento Indígena

O episódio mostra o deslocamento do centro da aprendizagem, na educação indígena, da figura do professor para o aluno como sujeito da aprendizagem. Vamos acompanhar as sugestões propostas:

Uma educação antirracista pode ser a ponte para essa percepção das diferenças, enquanto valores. Nesse percurso, os autores das histórias contadas precisam ser outros, negros e indígenas que apresentem os pontos de vista de seus povos, permitindo sairmos das histórias únicas que nos foram contadas.

Educação e Comunidade

No episódio “Educação e comunidade”, também do Canal GNT, temos a discussão a respeito de escolas antirracistas, como instituições comprometidas com a história e a cultura dos negros.

Os educadores, especialistas em questões raciais, mostram como a percepção do continente africano foi corrompida, contribuindo para visão estereotipada da região e das pessoas negras.

A visão negativa que a sociedade brasileira tem do negro resulta dessa construção histórica que não permitiu conhecer a negritude em lugar de poder, com destaque e qualidades a serem valorizadas. 

Para concluir

Nesse percurso, é de suma importância observar como a manutenção dos negros como a raça/etnia a ser exterminada pela força policial do Estado, ou a ser encarcerada em massa é parte de um projeto de nação (como na “guerra às drogas”).

O grande desafio está em mudar esse jogo. No jogo do capital, homem e natureza são mercadorias. Logo, são descartáveis, substituíveis.

Não é difícil, aos mandantes do sistema, conceder um espaço ou outro no tabuleiro. Assim, tanto é possível a estes reconhecer o racismo, como conceder voz a negros militantes e ativistas das questões raciais. Por outro lado, pode ser nestas frestas que a mudança vai sendo construída.

Educadores democráticos, antirracistas e anticapitalistas saberão fazer destes e de outros espaços e tempos, oportunidades para ensinar e aprender, para estudar.

Busquemos nas relações de raça, gênero e classe as ligações capazes de forjar uma comunidade radical de/para a aprendizagem, para a valorização da integridade.  

Educação e antirracismo: Para saber mais

Black Lives Matter/BLM – https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2020/06/03/black-lives-matter-conheca-o-movimento-fundado-por-tres-mulheres.htm

Canal GNT – Atividade pedagógica antirracista: vamos jogar o Jogo da Onça? | Por uma educação antirracista #EP2  https://www.youtube.com/watch?v=LjgA7YWbuh8

Canal GNT – A verdadeira história do povo negro que não te ensinaram na escola| Papo Rápido | Papo de Segunda – https://www.youtube.com/watch?v=wV4ZXfQPt2s

HOOKS, bell. Educação democrática. In: Fernando Cassio et al. Educação contra a barbárie: por escolas democráticas e pela liberdade de ensinar. São Paulo: Boitempo, 2019, p. 199-207.

HOOKS, bell. Ensinando a transgredir: a educação como prática de liberdade. São Paulo: Martins Fontes, 2017.

MUNIZ, Kassandra. “Educação antirracista: o que é e como aplicá-la”. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=T_P4_iYaTC4

 

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