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AS CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO TEXTUAL NA ESCOLA

6 de julho de 2021
E-docente

Desde os tempos mais remotos, a leitura e a escrita fazem parte da civilização humana, vários eram os significados de suas práticas. Para o escriba, por exemplo, ler significava declamar. A escrita surgiu como uma “testemunha imortal”, com capacidade de testemunhar os acordos de valores nas mercadorias, ser consultada para confirmar fatos orais e cessar a contendas, por meio de produção textual, sempre visando à leitura oral. 

Recentemente, os PCNs propuseram a prática da leitura para que o indivíduo descobrisse as regularidades da língua escrita e construísse o repertório de recursos linguísticos a ser utilizado na produção de textos (BAJARD, 2014). 

Neste cenário educacional, as condições de dificuldades na produção da leitura e escrita são evidenciadas em todos os níveis de ensino e, infelizmente, com a constatação de condutas metodológicas tradicionais dos professores. 

Como solucionar os desafios da produção textual?

Se mesmo com o avanço das ciências da linguagem, ainda persistem esses desafios dos alunos em produzir textos, precisamos desenvolver projetos integradores e formativos, de modo a conhecer e interpretar a realidade social, trabalhando atividades linguísticas com assuntos atuais, tais como: saúde mental dos jovens devido à pandemia, temas agregadores ao ensino da arte, da profissionalização dos jovens e aos futuros desafios sociais, como o acesso às tecnologias.

Acima de tudo, contribuir com subsídios teóricos e práticos dos eixos temáticos que a sociedade exige e que devem ser explorados em sala de aula. 

Compreende-se que as práticas de leitura e escrita se relacionam às manifestações de diferentes sociedades com propósitos específicos e necessidade de utilização de novas tecnologias, afinal, os áudios, vídeos e os aplicativos diversos fazem parte da rotina dos jovens; não há como desconsiderá-los em sala de aula.  

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A importância das experiências dos alunos para escreverem

Pensar as condições de produção textual na escola passa por indagações necessárias aos docentes, tais como considerar os alunos como indivíduos sociais em constantes relacionamentos com os outros, com sentimentos, inquietações e ansiedades e com a própria consciência de si mesmo (BAZERMAN,2007).  Às vezes, essas relações são próximas; outras, existem distanciamentos entre professores e educandos. 

Não se pode esquecer que as experiências de escrita abrangem as limitações do produtor de texto no que concerne aos temas como amizade, vida cotidiana, condições socioeconômicas e culturais que influenciam a vida do ser humano.

Os jovens podem realmente sentir ansiedade e insegurança para escrever algo novo, ou mesmo forte, que lhes traga lembranças de fatos significativos para a vida de cada um. 

Linguagem como aprendizado social e cultural

Assim, é necessário usar a linguagem como aprendizado social e cultural (BAZERMAN, 2007), relacionada às dimensões observadas por Vygotsky (1986) e Ferreiro (2002).

Essas dimensões, já apontadas por diversos teóricos, exigem planejamento, releituras, um aprendizado de escrita que tenha sentido e seja capaz de lançar fora a ansiedade e as frustrações, principalmente para os jovens que necessitam de orientações durante a vida escolar no ensino fundamental e, principalmente, na preparação para o exame do ENEM e de outras provas.

A Participação dos alunos no blog Tempo da Palavra

Como exemplo desse trabalho, compartilhamos uma experiência bem-sucedida. Como prática pedagógica, foi criado no blogspot o blog “Tempo da Palavra” para uma integração entre as aulas de Língua Portuguesa ao longo dos últimos anos, mas, principalmente, para que os textos produzidos pelos alunos não ficassem guardados numa gaveta ou esquecidos. 

Para isso, ao longo do tempo, foram planejadas produções de textos as quais integrassem, especificamente, estratégias motivadoras e que promovessem envolvimento dos alunos nos eixos temáticos. 

Como resultado do trabalho entre literatura e linguagem, algumas atividades tiveram, inclusive, a participação de outros professores, com a produção de textos de prosa poética sobre os sentimentos gerados durante esse período em que se vive com a pandemia. 

Blog heterogêneo

Esse cruzamento entre os conhecimentos, inovações e a própria realidade do indivíduo define o blog como heterogêneo e abrange diferentes leituras e áreas, em um enriquecimento das aulas de Língua Portuguesa, Redação e Literatura nas distintas séries do Ensino Médio. 

É um desafio imenso envolver a participação das turmas nas propostas de produção textual encaminhadas para o blog (www.tempodapalavra.com), porque o acesso no espaço escolar é possível, mas em casa, algumas famílias têm dificuldades de acesso à internet. Assim, o celular se torna o aparelho mais utilizado pelos jovens.

Leia também: Novas formas de divulgação do conhecimento científico.

Utilizando textos como ferramenta de estudo

Certo dia, mal rompia a manhã, a professora já sentia uma certa ansiedade, estava à espera dos alunos para as primeiras aulas. Chegavam sonolentos, precisava despertá-los com mais rapidez para o início da análise do romance policial “Os vizinhos morrem no romance”, do autor Sérgio Aguirre.

Muitos não tinham lido todo o texto. Houve apresentações dos papéis dos personagens na história. As turmas escolheram dramatizações e pequenos diálogos retirados da obra, mas que não deixassem transparecer o final da narrativa.  

O objetivo era provocar hipóteses sobre o assassino e levar os leitores na busca e reescrita de partes do romance ao estilo Agatha Christie. Havia competição acirrada entre os grupos.

A garrafa com chá de erva doce deixou os jovens curiosos, enquanto alguns tomavam um gole do chá, no meio de comentários engraçados sobre a bebida, outros apenas estranharam. Quem leu a narrativa sabia qual era a importância da bebida. 

Foram propostos relatos orais e escritos sobre as personagens da história, mas enfatizando que os alunos deveriam deixar um gosto de mistério, sem aprofundar as pistas sobre os suspeitos.

Dessa forma, a leitura e a reescrita do final da obra literária teria a interação necessária e o engajamento da escrita na busca por palavras desconhecidas, seleções de trechos, citações que comprovassem os argumentos utilizados. As leituras posteriores sobre os textos produzidos nos grupos respeitavam a criatividade dos alunos.  

Leia também: Como incentivar a leitura dos alunos do ensino fundamental 2.

Postando os conteúdos no blog

Em seguida, os textos reescritos e fotografias do evento foram selecionados para o blog para que todos pudessem expor os comentários. O(A) professor(a) conhece melhor do que ninguém as principais dificuldades cognitivas e linguísticas dos(as) alunos(as), das inseguranças desse processo de produção.  

As inquietações sobre as condições de produção textual permeiam a prática pedagógica de todos os docentes, sejam da área de linguagem ou não.

Reconhecer que os(as) alunos(as), quando escrevem seus textos, em qualquer momento de sua vida escolar, esperam uma resposta a respeito do que escreveram, que sejam capazes de permitir uma dialogia, entendendo-a como um momento de produção de sentido, de dizeres e de trocas significativas.

Todavia, muitas vezes a resposta vem apenas com o silêncio ou a marca de um visto, nota ou conceito, observações sobre gramática, mas sem as reais possibilidades de interação da linguagem. 

Planejando as atividades

Finalmente, para assumir a complexidade do processo pedagógico nas atividades de linguagem, é necessário planejar, avaliar os objetivos das atividades (ANTUNES, 2003, p. 34): “(Para que ensinamos? Com que finalidade?), os procedimentos (Como ensinamos?)” e, principalmente, as ações que temos conseguido, ampliando, assim, as competências comunicativo-interacionais dos alunos.

Leia também: ensino de leitura: por que precisamos falar sobre multimodalidade?

Conclusão

Essas experiências com o blog Tempo da Palavra, com as leituras e releituras dos textos dos produtores demonstraram-se complexas, mas deram certo porque havia uma biblioteca à disposição dos leitores com acesso à internet; além disso, os alunos gostaram da leitura do romance; houve participação das turmas envolvidas.

Desde a escolha do material, a professora sentia que a sensibilização dos discentes vinha da necessidade de aprendizagem a partir dos acervos disponíveis, suscitando assim a demanda. 

Referências

AGUIRRE. S. Os vizinhos morrem nos romances. Tradução de Juliane Matarelli. Belo Horizonte: Dimensão, 2010.

ANTUNES, I . Aula de Português: encontro e interação. São Paulo: Parábola Editorial, 2003. Série Aula:1.

BAJARD, E. Caminhos da Escrita: espaços de aprendizagem. São Paulo: Cortez, 2014.

BAZERMAN, C. Escrita, Gênero e Interação Social. São Paulo: Cortez Editora, 2007.

LEAL, L.de F. V. Reflexões sobre práticas escolares de produção de texto: o sujeito-autor. Belo Horizonte: Autentica/CEALE/FAE/UFMG, 2003. A formação do produtor de texto escrito na escola: uma análise das relações entre os processos interlocutivos e os processos de ensino. p. 53-67.

Professora Antonise Coelho de Aquino

Professora aposentada do IF SERTÃO PE – Campus Petrolina Zona Rural. Mestrado em Sociologia pela Universidade Federal de Pernambuco. Especialista em Metodologia do Ensino da Língua Portuguesa pela UPE – Universidade de Pernambuco- Campus Petrolina. Estudante de Psicanálise pela Instituição Inscopsi.  Autora do livro ‘Enredos de uma Travessia: a Ilha do Massangano no vale do São Francisco’, publicado pela Editora do IF SERTÃO PE. Criou em 2010 e administra o Blog/site Tempo da Palavra (www.tempodapalavra.com) como referência às atividades no Ensino da Língua Materna. Atualmente, realiza LIVES de obras publicadas por amigos e sobre assuntos relacionados ao Diabetes no Instagram. Tem interesse e estuda sobre o ensino de Linguagem e literaturas infanto-juvenis. Realiza revisões de artigos acadêmicos e textos literários. 

Contatos:

E-mail: antonisecoelho@hotmail.com

Instagram:  @antonise.revisora

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